sexta-feira, dezembro 23, 2016

O Que Está Por Vir

Aproveitem essa semana de Natal para ver essa joia chamada O Que Está Por Vir, de Mia Hansen-Love, no Glauber e no Paseo. É um filme perfeito para o Natal, porque reafirma relações humanas e empatia como as coisas mais importantes dessa vida, só que sem as toneladas de açúcar que um filme americano dedicaria a essa história, por exemplo.

A história em questão é uma crise de maturidade de uma professora de filosofia, casada com outro professor de filosofia, e às voltas com a doença da mãe, um divórcio a caminho e os filhos fora de casa. Parece, na descrição, um filme-cabeção, mas só os franceses para navegarem pelas águas tormentosas de mil referências intelectuais de forma natural, sem a sensação incômoda de name-dropping ou de citações gratuitas. Essa é simplesmente a vida destas pessoas, e pronto.

O filme se desenvolve nesses pequenos dramas cotidianos, mas numa cena em que a protagonista lê uma passagem de Blaise Pascal, a gente percebe o quanto esses microconflitos nos fazem humanos, pequenos na sabedoria mas imensos na capacidade de sonhar e imaginar. É um filme que, sem se posicionar desta maneira abertamente, propõe a filosofia como consolo para as loucuras da vida, talvez do mesmo jeito que Poesia, de Lee Chang-Dong, defendia a arte como refúgio.

O filme coreano me veio uma ou duas vezes na cabeça, não por apenas ser uma história de uma mulher sexagenária, mas pela defesa de uma beleza possível da vida, não por negação da dor, mas pela superação das dificuldades através da dor. Numa cena milagrosa, vemos a gloriosa Isabelle Huppert chorando no ônibus (choro esse testemunhado por outra passageira, que fica algo comovida), e de repente, começa a rir ao mesmo tempo diante de uma coincidência que observa pela janela.



A vida inteira cabe no choro e no riso simultâneo de Huppert, numa atuação que ainda mais espetacular quando se tem em conta de que a mesma atriz ressuscitou a sua gélida persona chabroliana para o Elle, de Verhoeven, com renovada desenvoltura. Que mulher é essa? Provavelmente é a melhor atriz do mundo, junto com outra que também vemos neste filme, numa cena em que a personagem da Huppert vai ao cinema - o momento mais prazeroso que vimos numa tela este ano.

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