Bom tempo sem escrever. Além da falta de tempo, o principal motivo é que comecei a ler dois livros exaustivos, e dedicava qualquer intervalo para adiantar a leitura. São duas histórias de adolescentes, contadas em primeira pessoa, com algum experimentalismo narrativo. Nó na Garganta, de Patrick McCabe, é infinitamente melhor do que Vernon God Little, de DBC Pierre, mas ambos são de leitura problemática.
Quanto ao primeiro tive a sensação de ler Guimarães Rosa em eslovaco. Há poesia ali com certeza, além da óbvia delicadeza de sentimentos e ações, mas a força do livro é abafada por uma tradução que não lhe permite entrega total – é o tipo de livro que se lê especulando como estava escrito em inglês. Talvez tente uma segunda vez no original, mas já antecipo as dificuldades. Pontuação corre solta, deve haver muita expressão fortemente irlandesa, etc. Enfim, segue trecho aleatório:
“Um homem feito de bolhas tomava conta da escola para meninos maus era difícil de acreditar mas era verdade lá estava ele na janela sua cabeça de bolha enorme e para fora ele vem pulando pula pula e Como vai o senhor! Ele exclama para o sargento, nunca vi uma cabeça tão brilhante, branca e polida como a cabeça que Padre Bolha tinha. Como vão todos! ele diz de novo e o sargento começa a resfolegar e tenta ajeitar seu uniforme. Muito bem padre fizeram boa viagem não foi mal padre obrigado por perguntar.”
Resumindo, Francie, garoto no interior da Irlanda nos anos 60, é perturbado pelo pai alcoólatra e pela mãe depressiva. Não por causa-efeito, ele cria um mundo sé dele, onde só é permitida a entrada do melhor amigo. Quando este começa a ignorá-lo, Francie vai ficando cada vez mais louco.
Quanto a Vernon God Little, de DBC (Dirty But Clean) Pierre, pseudônimo de Peter Warren Finlay, no todo, me lembra aquele clássico do Piores Clipes do Mundo, I'm too sexy for myself. Esse tipo de mal do ego também afeta escritores (e jornalistas), num terrível I'm too smart for myself. Não há um parágrafo nesse livro todo que não tenha sido escrito para ser espertinho e irônico, ou com a clara intenção de virar cult da cultura pop (hein?). Dá uma olhada:
“Adquiro um aprendizado: que caras mais idiotas do que eu acabam como encarregados. Veja como são as coisas. Não sou a porra de um gênio nem nada, mas esses retardados estão encarregados de cada um dos meus movimentos. O que estou começando a imaginar é que talvez apenas os imbecis estejam seguros neste mundo, os tais que andam a esmo com a manada, sem pensar em coisíssima nenhuma. Mas está me vendo? Tenho que pensar em cada porra de coisinha.”
O livro, vencedor do Booker Prize 2003, dá aquela péssima impressão causada pelos últimos diálogos de Clube da Luta, radiografia pop e rala da pós-modernidade, algo bizarro e cansativo, já que abafa qualquer possibilidade de conflito humano. Aliás, resumo: adolescente é acusado de cumplicidade num ataque de um aluno franco-atirador à escola local (Martirio, Texas), que deixou quase vinte mortos. A mídia manipula o caso, etc. Extremamente cansativo, mas acabou.
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