sexta-feira, dezembro 30, 2022

TOP 10 - 2022

Vamos lá. Com o "fim" da pandemia o circuito voltou à normalidade e muita coisa boa finalmente chegou aos cinemas. Então o TOP 10 do ano volta, seguindo o calendário comercial brasileiro/soteropolitano + streaming. Todos os filmes dessa lista passaram no cinema em Salvador. Para normalizar o top 10, não incluo aqui coisas que só entraram esse ano mas que listei no ano passado.

10 - Encontros, de Hong Sang-Soo, Coreia do Sul. Uma paixão de verão e várias possibilidades de realização ou não dessa paixão. O coreano dessa vez apresenta um esqueleto de dos seus filmes com apenas uma hora de duração, e deixa a impressão de que há várias cenas e sequências faltando, mas no fundo ele só está flexionando seus músculos ficcionais com elipses incríveis e deliberadas. Sim, é um "exercício de estilo", um mérito formal, mas continua impressionando. Pontos bônus pela estreia no mesmo ano de A Mulher Que Fugiu, o seu filme mais WoodyAlleniano.
Sessão dupla: Brigitte e Brigitte, de Luc Moullet.

9 - Má Sorte no Sexo ou Pornô Acidental, de Radu Jude, Romênia. Esse aqui é um ataque terrorista contra a Romênia, mas poderia ser contra o Brasil. É um filme frontal de um modo até infantil na desconstrução das instituições e costumes de um país a ponto de dedicar 1/3 da sua projeção a um dicionário de verbetes, mas a força da agressividade suplanta algumas simplificações. Como se não fosse suficiente, é o filme definitivo sobre a pandemia: enquanto gente morre como moscas, pessoas fazem uma inquisição a uma professora que teve um filme de sexo vazado.
Sessão dupla: O Fim do Homem Cordial, de Daniel Lisbôa

8 - A Mulher de um Espião, de Kiyoshi Kurosawa, Japão. Gélido thriller de espionagem na Segunda Guerra no Japão. O que chama a atenção aqui é que em geral esses filmes são um jogo de mentiras, mas aqui a surpresa vem do fato de que as personagens são sinceras nos seus sentimentos e motivações. A elegância suprema da forma-cinema.
Sessão Dupla: Desejo e Perigo, de Ang Lee.

7 - Elvis, de Baz Luhrmann, EUA/Austrália. Baz refaz o seu filme de sempre, usando Elvis como cavalo para suas meditações habituais sobre o pacto mefistotélico da celebridade (e do amor pela audiência), sempre selado com a frase mais cruel dos espetáculos: the show must go on. O controverso estilo do diretor encontra a figura perfeita para fugir da burocracia do mais chato dos gêneros, a biografia musical. Tudo em Elvis é maior que a vida e ainda assim não parece excessivo.
Sessão Dupla: Lola Montés, de Max Ophuls.

6 - Nope, de Jordan Peele, EUA. O amor pela parafernália do cinema num senhor filme sobre espetáculo, props, objetos de cena, com personagens que são dublês, contra-regra etc. É praticamente um faroeste sem armas, ou melhor, um faroeste cujas armas são máquinas de fotografar e filmar.
Sessão Dupla: Hatari!, de Howard Hawks.

5 - Il Buco, de Michelangelo Frammartino, Itália. Frequentemente descrito como uma "experiência espiritual", esse filme me parece o oposto. Ao recriar a expedição que chegou ao fundo do terceiro buraco mais profundo da superfície da Terra, Frammartino captura não um silêncio transcendente, mas materialista. O tempo que o diretor dedica a cada imagem é o necessário para que elas existem como são em filme, e não para extrair nenhum significado terceiro. Uma história paralela da morte de morador local não é uma metáfora religiosa, e sim uma confirmação naturalista: somos todos minerais.
Sessão Dupla: O Evangelho Segundo São Mateus, de Pier Paolo Pasolini.

4 - Marte Um, de Gabriel Martins, Brasil. Os conflitos da família brasileira num cinema que encontra a sua escala emocional exata, desde a terrível vontade de escapar da realidade - o espaço sideral, o futebol - até os laços humanos que tornam a vida não apenas suportável, mas até mesmo bonita, apesar dos pesares. Trabalho de precisão.
Sessão Dupla: Eles Não Usam Black-Tie, de Leon Hirzsman

3 - Decisão de Partir, de Park Chanwook, Coreia do Sul. Um filme todo reciclado a partir de partes recicladas de origem evidente, mais uma prova evidente da permanência do Vertigo de Hitchcock, com sua femme fatale trágica e assassinatos em lugares altos. Park, no entanto, parece estar aqui em modo romântico, porque a sua história de amor entre o detetive e a criminosa, na qual um sabe os defeitos do outro mas não consegue se afastar, é hitchcockiana mas filtrada por Truffaut. Melhor final do ano.
Sessão Dupla: A Sereia do Mississipi, de François Truffaut.

2 - Memória, de Apichatpong Weerasethakul, Colômbia/Tailândia. Esse é quase um espelho de Il Buco: em vez de olhar para o centro da terra de forma materialista, o diretor olha pro céu pra expandir a sua espiritualidade, não mais contida ao budismo da sua Tailândia natal, mas livre de limitações geográficas, encontrando os mistérios da vida na Amazônia colombiana e no céu. É como se seu registro encontrasse o panteísmo total, abraçando o universo.
Sessão Dupla: Não consigo pensar em nada parecido.

1 - Avatar: O Caminho da Água, de James Cameron, EUA. Um simplíssimo jogo de gato e rato com um vilão psicopata-imortal, mas gloriosamente filmado por um dos maiores diretores de ação de todos os tempos. São três horas e 10 minutos de uma inacreditável montanha russa. Não sei como, mas Cameron mantém seu dínamo em movimento tirando da cartola as coreografias mais rocambolescas para filmar lutas, perseguições, corridas e, melhor de tudo, o assombro pela natureza, mesmo que seja construída em computador. É bizarro, mas Cameron é capaz de fazer a audiência chorar com uma espécie de monstro em forma de baleia num mar de videogame. Enfim, é o cinema reduzido ao essencial, mas paradoxalmente na sua forma mais excessiva.
Sessão dupla: A General, de Buster Keaton.

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