domingo, setembro 10, 2006

Truffaut e as mulheres

Em O Homem que Amava as Mulheres, François Truffaut criou um personagem obcecado pelo sexo feminino para falar de si mesmo. Biógrafos contam histórias maravilhosas sobre isso: ele sempre se apaixonava pela estrela do filme que estava dirigindo, e talvez por isso, elas eram retratatas como deusas absolutas. Apesar disso, Roger Ebert nos lembra, todos os papéis femininos que ele criava tinham graves debilidades psicológicas, herança hitchcockiana. Tendo visto já boa parte de sua filmografia, e como ensaio para meu projeto de lista "As Mulheres Mais Espetaculares do Cinema", fiz uma compilação com minhas preferidas nos filmes do diretor.
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10 - Delphine Seyrig como Fabienne Tabard, em Beijos Proibidos
Antoine Doinel - personagem alter-ego de Truffaut em 5 filmes - já está casado e trabalha como detetive particular. Seu caso: o dono de uma loja de sapatos quer saber porque os funcionários lhe odeiam. Doinel passa a trabalhar disfarçado na loja, mas suas investigações são atrapalhadas pela presença de Fabienne Tabard, mulher do comerciante. Mesmo sem a beleza impressionante do tempo do Marienbad, charme não falta a Seyrig.

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9 - Bernadette Lafont como Camille Bliss, em Uma Jovem Tão Bela Como Eu
Camille está presa por assassinato, e é entrevistada por um estudante de sociologia preparando um texto para pós-graduação. O filme é uma comédia, e se sustenta nas travessuras sexuais de Camille, a garota meio burra, mas que sabe usar seus dotes físicos. Esses dotes são amplamente explorados por Truffaut. Se o filme fosse bom, o papel cairia bem numa Marilyn Monroe. Lafont não chega a tanto, mas faz sua parte.

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8 - Catherine Deneuve como Marion Steiner, O Último Metrô
Na Segunda Guerra Mundial, Deneuve é um atriz envolvida com um colega de peça, enquanto tenta esconder o marido judeu dos nazistas que ocupam a França. Filme morno, cuja única graça é a intensidade de Deneuve como mulher infiel. Poucas vezes esteve tão elegante, discreta. Sua agonia casa muito bem com a ambientação fria, nebulosa. Perfeita pra uma versão de Fim de Caso.

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7 - Jacqueline Bisset como Julie, em A Noite Americana
Bisset é belíssima, mas não deixa de ser a protagonista mais insípida de Truffaut. A deusa dele nesse filme é o próprio cinema; os personagens, acessórios. Valentina Cortese e Nathalia Baye se destacam, mas nenhuma delas é a musa, a protagonista do filme dentro do filme, a "estrela americana". Mesmo que o papel não ajude, Bisset conquista seu espaço só por aparecer na tela.

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6 - Julie Christie como Clarisse e Linda, em Fahrenheit 451
Como Christie se tornou um símbolo sexual tão forte? Vítor Pamplona explica: "mais importante não é ser bonita - é comportar-se como se fosse". Christie era bela sim senhor, mas foi sua "presença" que garantiu supremacia sobre mulheres muito mais bonitas. Nos olhares, gestos, voz, a moça magrela ficava deslumbrante. Não à toa foi a Lara de Dr. Jivago, e Mrs. Miller em Quando os Homens são Homens. Fahrenheit 451 se passa no futuro (onde os livros são proibidos), Christie faz jornada dupla como a esposa alienada e a amante esperta de um policial que descobre a literatura.

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5 - Françoise Dorleac como Nicole, em Um Só Pecado
Irmã de Catherine Deneuve falecida precocemente, Dorleac é uma aeromoça que aparece para iluminar a vida de um professor de literatura em viagem a Lisboa. Iluminar é a palavra certa. Dorleac domina o P&B como uma diva do cinema mudo, mas sem as teatralidades: frágil, adulta, apaixonante. Vale dizer que pouca coisa de Truffaut é melhor do que esse filme delicado e sutil sobre paixão, adultério e vingança. Nada a ver com novela mexicana.

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4- Isabelle Adjani como Adele Hugo, em A História de Adele H.
A filha de Victor Hugo viaja para os Estados Unidos atrás de um amor não-correspondido, sofre com as seguidas rejeições, faz várias loucuras, até perder o controle das faculdades mentais. O papel é dificílimo e o filme, pesado. Truffaut precisava de uma atriz intensa. Viu Adjani num teatro e, diz a lenda, escreveu-lhe uma apaixonada carta, cujo trecho mais célebre é: "Você merece ser filmada todos os dias, inclusive aos domingos".

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3 - Claude Jade como Christine Doinel, em Domicílio Conjugal
A maravilhosa esposa de Antoine Doinel é um encanto sem fim, desde Beijos Proibidos. Ela já começa Domicílio Conjugal feliz da vida,passando em várias lojas, somente para corrigir os vendedores: "Mademoiselle, não. Madame!" Somente o comportamento meio insano de Doinel para justificar suas infidelidades. Quem tem uma mulher dessa em casa não precisa de mais nada na vida. No filme, ele corrige o erro a tempo, e ruma para um dos finais mais felizes já vistos.

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2 - Jeanne Moreau como Catherine, em Jules e Jim
O filme deveria se chamar Catherine: Jules e Jim apenas gravitam em torno dessa mulher louca, intensa, arrebatadora. Mulher complexa, cheia de nuances, nada fácil: impossível de ser contida, sexual e emocionalmente. Moreau não deixa pedra sobre pedra do espectador - seria essa a melhor interpretação da história? A boca amarga, o olhar hipnótico, enquanto canta "Le Tourbillon de la Vie". Muito boa a história de Milton Nascimento com Jules e Jim. Viu quatro vezes seguidas, no mesmo dia, e compôs por dias sem parar, sob efeito da poesia da coisa toda.

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1 - Fanny Ardant como Mathilde Bauchard, A Mulher do Lado
Em A Mulher do Lado o adultério vira crime - Ardant é a mulher ao mesmo tempo frágil e perigosa; pode causar danos a si mesma e a quem ama, mas não pode evitar, arrebatada de amor. Nunca pudica, ela é o exemplo perfeito do amor espalhado por todo o corpo - não somente em sua vontade de expressá-lo fisicamente pelo sexo, mas também como uma doença. Já viram isso antes? Ela desmaia de amor, tamanha a tensão. Seus estados ficam alterados, irradiando paixão nos cabelos, nas pernas, nos olhos insinuantes.
O engraçado é que ela hoje é tão bonita como há 30 anos. Alguém viu 8 Mulheres?

Obs.: Fora da disputa: De Repente, Num Domingo; A Sereia do Mississipi, O Garoto Selvagem, As Duas Inglesas e o Amor, O Quarto Verde; O Amor em Fuga.

Mais fotos de Ardant:





3 comentários:

Pondé disse...

Com todo o respeito às divas du cinéma, mas Jacqueline Bisset tá um tesão nesta foto! By the way (que viadagem!), quando verei uma lista das musas atuais? Outra coisa: "há" e "atrás" formam um péssimo casal. Eviti-os.

Saymon Nascimento disse...

Perfeito, Pondé. Vivendo e aprendendo. Fico procurando redundâncias no texto para passar a faca e essa sempre me passou em branco. Perfeito. Vou editar.

Pondé disse...

A princípio não, Saymon. Tenho, inclusive, gaveta de uma entrevista com aquele ufólogo que afirma "Jesus é um robô". De qualquer forma, penso em dar um tempo com o D&N e abrir um blog atemático. A preguiça é que não me deixa em paz.