Boa chave para decifrar o mistério de Maria Antonieta é tentar ver o filme de Sofia Coppola por um caminho pessoal-cinematográfico. Não a ponte fácil entre a corte francesa e a realeza de Hollywood, de que a diretora faz parte. Não – o filme da Coppola parece feito em primeira pessoa porque reacessa os dois anteriores da diretora, As Virgens Suicidas e Encontros e Desencontros, com preocupações que parecem, mais uma vez, vindas de Antonioni, Godard e Fosse.
Do italiano, o gosto por filmar mulher, a alienação feminina, e um ritmo de cinema que é muito particular, o tempo morto, de silêncios barulhentos. Sofia continua filmando com calma, sabendo compor planos, aliando tema (mulher, pressão, costumes, incômodo) a uma rigorosa aplicação visual. De Godard, vem menos, mas o fator habitual que Coppola já tinha absorvido: a vontade de filmar a inconseqüência e a vibração da juventude.
O aparente descolamento dramático do rock com o clima de cinema abotoado parece vir daí, de Godard, e das experiências com música e som em filmes como Uma Mulher é Uma Mulher e Alphaville. Imagem prum lado, som pro outro, mas o estranhamento resultante é o que torna esse discrepância coerente. Filme estranho para gente esquisita (ou deslocada, melhor dizendo). Pois bem, é isso, mas não só isso. O rock é fundamental para criar o excesso do entretenimento, dos jogos, champagne e noitadas enquanto o mundo lá fora cai em convulsão. Isso é Fosse, isso é Cabaret.
Apontar esse tipo de coisa não é maletice cinéfila, nem checklist de influências. Isso já estava estabelecido desde aquele discurso do Oscar, quando Sofia apontou esses diretores como fundamentais para Encontros e Desencontros. Por isso chamei essa visão de pessoal-cinematográfica no início do post. Sofia deve ter sido viciada em filmes, tendo crescido com eles ao redor. Ela se formou como pessoa cinematograficamente, sendo tocada profundamente pelas obras desses diretores. Tanto suas preocupações autorais quanto seu jeito de filmar me parecem reflexo dessa história toda com o cinema.
Parece o tipo de coisa que se pode dizer de qualquer diretor, mas em poucos casos consigo ver relações desta profundidade entre artista criador e artista influenciado, ao ponto que a obra do influenciado é determinada quase que totalmente por sua memória cinematográfica. Caso semelhante, em registro bem diferente, seria Brian de Palma, e seu personalíssimo cinema de peças recicladas.
Um comentário:
adorei seu brainstorm, acho q vou aproveitar coisas dele na minha monô (que vou terminar nas coxas qdo voltar daqui)
beijo!
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