Gustavo me pergunta o que acho do Reparação, de Ian McEwan. É o tipo de coisa que lhe dá uma bela duma rasteira, por ser escrita com um classicismo sufocante, minimalista – e se revela estruturalmente uma cama de gato das mais escrotas. Arma toda esse prosa cristalina, clara, num esqueleto que joga toda a trama num fluxo temporal que é perfeito para esconder e mostrar o que a gente precisa saber em cada exato momento. E não é confuso. Confuso está o post.
É isso: o livro tem um plot já infernal (estupro, pedofilia, guerra), mas é a organização que amplifica o efeito no leitor (eu). São quatro partes: diferentes pontos de vista, não do mesmo acontecimento, mas de suas conseqüências em 50 anos, por aí. Principalmente ao final, McEwan leva o livro a um jogo de metalinguagem muito sofisticado, mas nunca exibicionista ou auto-importante. A metalinguagem é o molde da tragédia de Briony, a menina inteligente que queria ser escritora.
Nesse exato momento, voltei a McEwan e sua primeira indicação ao Booker Prize, Ao Deus Dará. Li pouco, ainda, mas já me parece produto da linha “Veneza Mórbida”. À exceção da belíssima comédia romântica – extremamente adulta e sincera – Summertime, de David Lean, minha memória da cidade italiana só inclui o terror angustiante de Nicolas Roeg¹, o desespero do olhar de Visconti-Mann² (não li o livro, mas imagino), a crueldade de Joseph Losey³, e principalmente, o jogo de poder e afeto de Henry James4.
1 – Inverno de Sangue em Veneza
2 – Morte em Veneza
3 – Eva
4 – As Asas da Pomba
(copyright do uso de notas de rodapé: Tiago A.)
Um comentário:
ei, saymon, antes de mim veio sterne ;)
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