domingo, outubro 28, 2007

review

Não postei aqui:

Nunca é Tarde Para Amar (veículo para Michelle Pfeiffer é bem imaturo)

Encontros ao Acaso (mulheres de verdade, e um belo papel para Ashley Judd)

Nação Fast Food (Traffic preguiçoso sobre hamburger)

Morte no Funeral (Oz engraçado e escatológico)

terça-feira, outubro 23, 2007

Emoções sem lágrimas e verões violentos

A Roda da Fortuna é o filme preferido de Santiago, o mordomo a quem João Moreira salles dedica seu mais recente documentário. A cena a seguir mostra Fred Astaire e Cyd Charisse andando no parque, e de repente, "acontece uma coisa linda e gratuita", como diria Salles.



O filme de Minnelli é o casamento da raposa. Tenta conciliar a elegância p&b e RKO de Astaire com o colorido explosivo da Metro, e dá ao ator dois números energéticos à Gene Kelly. Charisse não é o melhor par para Astaire, jamais funcionaria sem cor, e dança clássico, ao invés do tap dancing. Num desses mistérios da humanidade, o filme é uma obra-prima.

Deve ser a grife Minnelli. Setaro fez recentemente um belo post sobre o diretor, rei, da comédia sofisticada ao musical colorido, mas também nos "melodramas ásperos". Sem contradição - o excesso cênico de seus filmes leves no fundo me parecem uma tentativa de mascarar uma visão de mundo pessimista e ácida. Não me lembro de quem é essa idéia, mas concordo que Minnelli, com seu exagero de cenários e figurinos, busca reconstruir o mundo. Assim como Jacques Demy, mas essa é outra história.

Voltando aos melodramas ásperos, Minnelli fez Assim Estava Escrito e Deus Sabe Quanto Amei, mas o grande mestre do estilo é Douglas Sirk. Ultra-barroco, fazia filmes supostamente xaroposos, mas a sensação mais comum diante do que ele faz não é lágrima, é estupefação. O excesso é crítico, diz o oposto do que parece dizer. Não há emoção fácil - todos os códigos do gênero estão ali, mas funcionam ao contrário. Incrível.



Almas Maculadas: Sirk para Faulkner

Os mais badalados são Tudo o Que o Céu Permite, Imitação da Vida e Palavras ao Vento, filmes que gritam de longe "falsidade", "petróleo", "sexo", "família"... Meu preferido é outro: Almas Maculadas, filme em preto e branco cortante sobre homens vivendo em perigo em corrida de aviões. Adaptação de Pylon, de Faulkner, é o Sirk onde esse sentimento de inner America é mais forte. Não por acaso, parece uma mistura do Sirk padrão com o mundo de Os Eleitos, de Tom Wolfe.

***

Na lista de aniversário, destaquei o impacto de Verão de 42, o doce, amargo, e podre de melancólico filme de Robert Mulligan sobre o relacionamento de um adolescente com a mulher mais velha que perdeu o marido para a guerra. Em 1943, um plot parecido na Itália, em Verão Violento, de Valerio Zurlini.

Esse aqui é melodrama de verdade, intenso, cruel e fatalista, com um Jean-Louis Trintigant (que estava em todas no final dos anos 50) já adulto e a viúva sensualíssima e carente de Eleonora Rossi Drago. O mundo é o mesmo de Aquele que Sabe Viver (Itália, praia, férias, sexo, jazz), mas Zurlini usa a velha marreta narrativa da guerra para acabar com tudo.

Amostra grátis, um dos 15 pontos altos do filme, o primeiro beijo. Quanta emoção, quanta sofisticação, e essa fotografia Antonioni da madrugada, para Eleonora Rossi Drago, beleza rara, grande atuação. Incrível.

domingo, outubro 21, 2007

Lost in Translation

Já tinha postado isso num comentário no blog de Gabriela, mas deixa eu compartilhar. Um clip com cenas de Lost in Translation com Trouble, do Coldplay, na trilha. Difícil olhar para Scarlett Johansson sem um protetor contra paixão. Mas eu não devia gostar desse clip. Gosto de Coldplay, mas juntar essa música ao filme é apelação. Que seja concessão minha à obviedade, então.

Devia rever o lindo filme da menina Coppola. O último, Maria Antonieta, é dotado de incrível fermento mental - quanto mais você pensa nele, melhor ele fica. Aquele primeiro, Virgens Suicidas, era de uma melancolia implacável. Esse do meio é o melhor. Lindo. Adulto. Complexo. Romantismo melhor e recente, só aqui. Ou aqui. (Não é versão do filme - a de Nat King Cole - mas casa perfeito com a montagem. Viva a reapropriação).

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Santiago, de João Moreira Salles, talvez seja o melhor filme do ano. Mostra o diretor homenageando o mordomo do casarão de seu pai, figura apaixonada por todas as nobrezas, por ópera e cinema. Lembra algumas coisas - para comparar e não ter que assumir a responsabilidade de elaborar o pensamento: 1) Cães Negros, de Ian McEwan e o biógrafo se descontruindo enquanto escreve o livro; 2) referência óbvia, mas o grande livro Vestígios do Dia, de Kazuo Ishiguro; 3) o senso de decadentismo e de evaporação da aristocracia em vários filmes de Visconti, especialmente O Leopardo.

As coisas mudam para continuar as mesmas? Nem sempre, e às vezes a solução é se refugiar voluntariamente no passado, como fez o próprio conde vermelho, e mais recentemente, o russo Aleksandr Sokurov.

quinta-feira, outubro 18, 2007

Se Débora quer que o Gregory peque

Anunciaram na manhã de hoje a morte de Deborah Kerr, 86. Seis indicações ao Oscar, perdeu todas, mas ganhou uma estatueta honorária quando Sintonia de Amor fez uma homenagem ao seu maior sucesso, o weepie Tarde Demais Para Esquecer. O romance na tela com Cary Grant garante até hoje suspiros apaixonados, mas particularmente, não gosto. Envelheceu, ficou choroso.

Outro sucesso de Kerr foi A Um Passo da Eternidade, de Fred Zinnemann, que tem a cena do beijo na praia. Filme quadrado, mal azeitado, dramalhão, que tem entre seus inúmeros deméritos uma atuação muito ruim de Frank Sinatra, que, claro, venceu o Oscar. A piada é de que Sinatra teria conseguido o papel com a ajuda de suas conexões com a máfia, episódio reproduzido em O Poderoso Chefão na historinha de Johnny Fontane.


Pois bem, o Imdb conta em 52 filmes a carreira de Kerr, muita coisa hoje difícil de achar. Deixa eu ver o que mais vi: Quo Vadis, épico barato roubado pelo histrionismo de Peter Ustinov no papel de Nero; o Júlio César de Joseph L. Mankiewicz, onde ela some diante de Marlon Brando, James Mason e John Gieguld... O gigantesco musical O Rei e Eu, onde ela mais uma vez se deixa ofuscar; desta vez, por Yul Brynner. Há também a divertida elegância de Do Outro Lado, o Pecado, de Stanley Donen. O filme não é lá essas coisas, mas Kerr se diverte à vontade como uma decadente lady inglesa, fazendo par novamente com Cary Grant.

As grandes atuações de Kerr estão em outros filmes: Narciso Negro, incrível e sombrio filme de Powell + Pressburger, ainda nos 40, sobre freiras isoladas numa região remota da Ásia; Bom Dia Tristeza, milimetricamente perfeita como a formal Anne Larson, vítima das intrigas de uma adolescente mimada. O resultado é trágico.

Deborah Kerr em Os Inocentes, de Jack Clayton

Do que vi, a melhor interpretação fica entre Os Inocentes, adaptação impecável (roteiro de Truman capote) de Jack Clayton da novella A Volta do Parafuso, de Henry James, e Pelo Amor de Meu Amor, primeira versão do Fim de Caso de Graham Greene para o cinema, dirigida por Edward Dmytryk.

Nesses dois filmes, os cacoetes hollywoodianos que ela adquiriu na passagem pela América dão lugar a um sutil minimalismo, a nuances perceptíveis em falhas na fala, olhares delicadamente desviados... Há aquela sensação permanente de que há sempre uma emoção interna, abafada. Kerr é magistral nessas atuações baseadas no não-dito, coisa tão tipicamente inglesa.

domingo, outubro 14, 2007

Medos Privados em Lugares Públicos

Uma crítica a Tropa de Elite é o tipo de texto que não precisa de apresentação do objeto para o leitor. Mais de um mês depois do vazamento do filme no mercado informal, é bem possível que boa parte do público pagante vá ao cinema somente para conferir mais uma vez o longa impressionante que viram na tela da tv, em busca de uma experiência ainda mais potente. Já há uma semana em cartaz no Rio e em São Paulo e expandindo no feriadão para outras capitais, os bons resultados de bilheteria só confirmam o fato de que a pirataria fez muito bem ao boca a boca do produto.

Por outro lado, talvez essa asserção seja injustiça com o filme, que tem méritos suficientes para ser um grande sucesso. Méritos, além dos artísticos, de comunicação. Houve muita coisa boa nessa década no cinema brasileiro, mas pouca coisa dentre esses bons lançamentos que tivesse tanto apelo. Além do fator Zezé di Camargo e Luciano e do esquemão da Globo, Tropa de Elite e Cidade de Deus provam que só mesmo a questão da violência e da segurança pública embalada no formatão policial faz o brasileiro tirar a bunda do sofá e ver filme nacional.

Não é só a similaridade de alcance de público e os tiques de edição que unem os filmes de José Padilha e Fernando Meirelles. Nos dois casos, a crítica parece reconhecer as qualidades cinematográficas, mas fica presa em questões de representação. Os longas usariam sua fluência narrativa a serviço de uma ilustração pobre e perigosa de classes sociais menos favorecidas. Enquanto a discussão de Cidade de Deus ficou mais ou menos retida na dicotomia entre a estética glauberiana da fome e a suposta cosmética publicitária da geração 02 Filmes, o debate tomou dimensões maiores com Tropa de Elite: o filme virou fascista.

Já que chegamos até aqui, vamos usar essa chave para entrar no filme de Padilha. Como se sabe, a tropa de elite do título é o Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro, grupo conhecido pela incorruptibilidade e pela truculência. Quando o resto corrupto da polícia faz merda, parceiro, quem vai limpar a sujeira é o Bope. O Capitão Nascimento (Wagner Moura, perfeito) é símbolo do batalhão. Acredita que quem está em guerra (no caso, contra o tráfico) pode passar por cima de convenções sociais em nome de um bem maior. Vale então agressão, tortura e execução sumária.

O diretor conhece e filma vários ângulos da questão – os traficantes, a classe média ongueira e hipócrita, os policiais corruptos e os justiceiros implacáveis, o Bope. Daí a acusação de fascismo: o filme tomaria partido do Batalhão. A platéia vibra com o Cap. Nascimento, promovido a herói.

No fundo, essa aproximação míope entre o Bope e o pensamento do diretor decorre de uma imprudência de Padilha e de seus roteiristas Bráulio Mantovani (Cidade de Deus) e Rodrigo Pimental (ex-Bope) no uso da narração em off, justamente do Capitão Nascimento. Da primeira à última cena, a voz de Wagner Moura está no ar, mostrando a visão do mundo do militar, suas táticas de guerra e justificações para o abuso de poder. Não raramente, a presença do “voice-over” se dedica aos detalhes mais bestas, como se explicasse aos espectadores mais burros o que está acontecendo na tela. Ao fim de duas horas de narrativa exemplar, o espectador completamente imerso nesse mundo, uma certa identificação com o cicerone é inevitável.

Padilha justifica sua escolha como uma abordagem contra-intuitiva. Em geral, o espectador espera identificar rapidamente em um filme a âncora a que vai se apegar e torcer. O diretor prefere uma aproximação mais complexa. Assim como no espetacular documentário Ônibus 174, não cola o filme num herói. No documentário, associava a narrativa do seqüestro do coletivo à história de Sandro Nascimento, o bandido que acabou morto em junho de 2000.

O método é arriscado. Em Cidade de Deus, Meirelles preferiu filtrar o crime organizado na favela usando um personagem de fora da ação, não por acaso, um fotógrafo. Padilha se atira contra um histórico de narrativas nacionais sem muita exploração da vilania para além da telenovela. No Brasil, cineastas sempre tiveram interesse em gente, mas muito pouca visão para perceber o quanto há de humano na maldade.

Independentemente da louvável ambição de Padilha, o excesso da narração em off ou o fato de que o capitão é a única pessoa que tem “vida pessoal” compromete sua vontade de fazer um filme nuançado. Chegamos perto demais de Nascimento, a um ponto em que, por mais que se consiga registrar as relações complexas e sociais a que se dedica Tropa de Elite, a visão geral se perde diante da identificação com o protagonista.

Por outro lado, e apesar do off, o capitão não é construído de maneira profunda o suficiente para que o filme se sustente como análise dessa mente doentia. Não se trata aqui da diferença entre Brasil e Estados Unidos, onde Coppola nos faz torcer por Michael Corleone e é gênio. Padilha não poderia ter usado esse exemplo no Roda Viva, porque está sempre claro que o horizonte de expectativas do diretor é outro. Ele quer ser relevante socialmente, mas diminui seu próprio alcance flertando com um quase-psicopata. Nessa indecisão, temos um Taxi Driver com engrenagens girando em falso nos dois lados da questão – o privado e o público.

Para uma crítica já com os dois pés atrás em relação a esse estilo 02, chamar Padilha de fascista é daqui pr'ali. Acusação, que, por mais que o diretor brinque com fogo deliberadamente, é falsa. Há sempre, mesmo nos momentos em que Padilha está mais próximo da chama, uma reserva de segurança que impede que tudo vire propaganda institucional da tortura e do abuso aos direitos humanos. Como bem disse o crítico Luiz Zanin Oricchio, distanciamento faria muito bem ao filme.

Pena que, diante dessa polêmica, os méritos narrativos de Padilha fiquem em segundo plano, como se fossem banais ou desimportantes. Não. O filme pode ter seus problemas, mas ainda é avis rara no que se refere a poder de envolvimento em grande escala e de qualidade. Pode não haver aqui muita novidade em relação ao que vem sendo feito desde Cidade de Deus em termos técnicos, mas nada mais desejável que a competência estável. E, claro, a excelência estrutural do roteiro, sempre um problema maior no cinema brasileiro.

segunda-feira, outubro 08, 2007

Eu, repórter

Experimentei muito pouco ser repórter nessa minha brevíssima carreira jornalística, mas nessa semana, desencantei. Fiz dois especiais para o A Tarde On Line, onde estou trabalhando há um mês. O primeiro é esse aqui, onde falei com cinco pessoas que participaram do Fora Collor, há 15 anos. O segundo*, fiz em parceria com a repórter Tássia Novaes, sobre a situação dos pescadores de Saubara alguns meses depois da maré vermelha.

*Minhas matérias são as duas últimas, mas leiam tudo, claro.

terça-feira, outubro 02, 2007

22

Hoje, 2 de outubro, é meu aniversário. Deixo aqui em comemoração uma lista de 22 filmes com os quais tenho relação afetiva forte. São todos grandes filmes, mas não exatemente aqueles que eu consideraria os melhores se tivesse que parar para pensar. Não basta ser obra-prima, tem que ser a minha cara, ou ao menos, bater forte. Obviamente, tem muito mais filme que pode não ter entrado agora por esquecimento, ou por indecisão em relação a outro que acabou entrando, essas coisas de lista. Pelo menos, que fique como registro instantâneo do que faz a minha cabeça nesse aniversário.

22 - Weekend à Francesa, de Jean-Luc Godard


21 - Um Certo Capitão Lockhart, de Anthony Mann


20 - Cupido é Moleque Teimoso, de Leo McCarey


19 - Verão de 42, de Robert Mulligan


18 - Amor à Flor da Pele, de Wong Kar-Wai


17 - O Homem Que Matou o Facínora, de John Ford


16 - Fuga ao Passado, de Jacques Tourneur


15 - O Salário do Medo, de Henri Georges Clouzot


14 - Jules e Jim, de François Truffaut


13 - A Face Oculta, de Marlon Brando


12 - As Pontes de Madison, de Clint Eastwood


11 - Trono Manchado de Sangue, de Akira Kurosawa


10 - Hara-kiri, de Masaki Kobayashi


9 - Um Corpo Que Cai, de Alfred Hitchcock


8 - Os Guarda-Chuvas do Amor, de Jacques Demy


7 - A Doce Vida, de Federico Fellini


6 - O Indomado, de Martin Ritt


5 - Rocco e Seus Irmãos, de Luchino Visconti


4 - Carta de Uma Desconhecida, de Max Ophuls


3 - A Sangue Frio, de Richard Brooks


2 - O Poderoso Chefão, de Francis Ford Coppola


1 - Lawrence da Arábia, de David Lean