O primeiro dos filmes foi O Segredo das Jóias, noir famoso pela participação de Marilyn Monroe. Há mais fama do que mérito - ela ainda está apagada, verde, sem a presença e a potência dramática que teria no seu último filme, justamente dirigido por Huston, Os Desajustados. Mas tudo bem, se há um papel feminino que importe é o de Jean Hagen, a maravilhosa Lina Lamont de Cantando na Chuva, em registro totalmente diferente. Somem a voz estridente e a presença caricata, entram uma atuação sincera e de cara lavada, crua. Muito boa.
Ainda assim, estamos na beirada do filme. A princípio, O Segredo das Jóias não parece segurar a reputação que tem, de ser uma das obras-primas do diretor. Talvez não seja mesmo, mas o filme cresce imensamente à medida que a trama evolui. No começo, o plano de um assalto. Depois, a execução. Por fim, o acerto de contas.
Corrida para lugar nenhum: Jean Hagen e Sterling Hayden
Ao contrário de outros filmes do gênero que são geniais do início ao fim - como Rififi, de Jules Dassin, ou Homens em Fúria, de Robert Wise -, O Segredo das Jóias só revela sua amplitude na parte final. Huston retoma o tema da ambição fracassada que faz parte de dois de seus filmes mais importantes, O Falcão Maltês, e O Tesouro de Sierra Madre. A diferença é que o tom cáustico dos longas anteriores é atenuado e substituído pela nobreza da derrota, num lance quase fordiano.
Sem querer estragar o que não dá para arruinar, a parte final é ancorada justamente nisso, no fracasso coletivo. Na mais bela cena, o ladrão veterano assiste a uma garota dançar ao som do jukebox, enquanto a polícia espera do lado de fora do bar. Cena nostálgica e melancólica, mas principalmente doce.
O filme dois da maratona, embora tido quase como menor dentro da carreira do grande mestre, é tão forte quanto O Segredo das Jóias. O Céu Por Testemunha é um exemplar justamente do outro grande tema dos filmes de Huston: ser estrangeiro.
Deborah Kerr e Robert Mitchum são uma freira e um fuzileiro isolados numa ilha do Pacífico Sul durante a Segunda Guerra Mundial. Só têm um ao outro, rola clima, etc, mas nunca em um nível que ataque a inteligência do espectador. É tudo muito sutil, e vemos crescer e tomar forma na tela uma relação que é, acima de tudo, de amizade, apesar da tensão sexual. O filme se sustenta na relação de um homem e uma mulher, e, para um grande diretor, isso basta.
Se a Deborah quer que o Robert peque
O tom é leve, aventuresco, inteligente, com aquele mesmo charme de The African Queen, não por acaso, Uma Aventura na África, título nacional. Mitchum e Kerr, aliás, em nada devem a Bogart e Kate Hepburn. Mitchum brilha no seu melhor papel de leading man, cavalheiro completo sem perder um fio da presença masculina, e sempre deixando nas entrelinhas um passado sugerido do personagem: orfanato, reformatórios, Marinha - solidão e paz acalmada, esperteza e bravura.
Kerr retoma o hábito uns doze anos depois do grande papel em Narciso Negro. Naquele filme ela era uma freira isolada no Nepal, acho, enfrentando todos os mistérios e a tensão que não vem de lugar nenhum - só do ambiente (se tivesse havido alguma adaptação de Passagem Para a Índia nessa época, não haveria melhor escolha para o papel de Adela Quested). Em O Céu Por Testemunha, a tensão é mais leve, e Kerr se vira imprimindo charme delicado a um personagem que deve ser contido, com o corpo coberto o tempo inteiro. Se há uma atriz que sabe trabalhar nas minúcias, é ela.
No fim, fica o grande prazer de ver esse timaço trabalhando, cada um no seu elemento, todos atingindo fácil a perfeição. Filmão.
Um comentário:
'Tão fazendo o filme de Wolverine. Robert Mitchum podia ser o Dente-de-Sabre fácil.
Postar um comentário