Texto meu, publicado originalmente no Coisa de Cinema:
Se Amores Brutos e
A principal idéia que percorre o cinema do mexicano é o bordão “tudo está conectado”. Amores Brutos e
Assim, a história se desdobra. dois garotos marroquinos atiram contra um ônibus de turistas somente para testar o alcance da bala. Uma turista americana é atingida, e o marido vai tentar desesperadamente salvar sua vida. A polícia marroquina corre atrás dos responsáveis pelo incidente, logo tido por autoridades internacionais como terrorismo.
A empregada da mulher baleada nos Marrocos quer ir ao México, para assistir ao casamento de seu filho. Por causa do acidente, leva os filhos do casal na viagem, e se complica na volta pra casa. Há também uma adolescente japonesa surda-muda que não parece ter muito a ver com isso tudo. O roteiro tira da cartola uma conexão na história somente para defender sua tese: tudo está conectado.
Iñarritu e o roteirista Guillermo Arriaga (do incrivelmente sutil Três Enterros, de Tommy Lee Jones) provavelmente têm razão em insistir com tanta ênfase essa teoria. Isso vende muito. É o tipo de charlatanismo que as pessoas querem ouvir, afinal, essa força superior que nos une anula o livre-arbítrio e permite a remissão de todas as culpas. Ninguém é responsável - “não sou má, só fiz uma coisa estúpida”, diz um personagem. Todo mundo é vítima, todo mundo chora, e o poder de identificação disso é imenso.
Não deixa de ser estranho que um filme com tanta mão pesada tenha os melhores trabalhos dos colaboradores do diretor. Rodrigo Prieto, fotógrafo, e Stephen Mirrione, montador, parecem melhorados pelo trabalho nos muito elegantes Brokeback Mountain e Boa Noite e Boa Sorte, respectivamente. A imagem não briga com o que está na tela, as situações humanas não precisam mais disputar espaço com os técnicos.
Pena que sejam essas situações que revelam o equívoco de Iñarritu e Arriaga. Tentando filmar esse elo invisível, eles encaram os personagens de cima, e perdem o primeiro plano. A preocupação estrutural destrói o ponto forte de seus filmes, a serviço de um ponto de vista bastante tolo.
No final do filme, vem o símbolo perfeito deste tipo de equívoco. Duas pessoas se abraçam, a câmera se afasta (via efeito digital) e mostra o céu iluminado de uma grande cidade ao som da música indecentemente piegas de Gustavo Santaolalla – fade to black. Pronto. Ainda há esperança e dá pra viver neste mundo globalizado.
Não vem ao caso discutir o teor desta “mensagem”. Qualquer comercial de televisão pode dizer a mesma coisa. O problema é que esse tipo de conteúdo associado a um tratamento exagerado soa como o pior dos best-sellers de auto-ajuda. Para quem não chorar, só resta a náusea. Babel recebeu sete indicações ao Oscar, incluindo filme, direção e roteiro.
4 comentários:
Parabéns pelo seu texto! Maduro, consistente e crítico. Gostei.
não lembro mais de 21 gramas, mas queria falar um negócio sobre amores burros, digo, brutos - o único que eu lembro de ter gostado um pouquinho.
é que eu sempre pensei que a linha de conexão entre as estorinhas iñarritianas nesse filme fossem os cachorros que lhe dão título (no original, claro).
mas não estou certo disso porque dormi na parte final. um sono bem bom, por sinal.
Sim, são os cachorros mesmo. Melhor parte foi na hora que você dormiu, em que o cachorro do acidente faz uma chacina nos cachorros do velho.
Usar cachorro e criança é apelação e é isso que ele faz em todos os seus filmes. Sem falar no discurso panfletário anti-americano. Realmente um filme insuportável.
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