sexta-feira, fevereiro 22, 2008

O equívoco musical de Sweeney Todd

Desde A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça Tim Burton não era tão violento. Não por acaso, o diretor volta ao sangrento mundo das degolas e decapitações, mas sem metade da graça do filme de 1997.

O problema de Sweeney Todd está justamente no motivo de aclamação do material original: a música. A história do barbeiro da Rua Fleet nasceu nos palcos da Broadway, como um musical do consagrado compositor Stephen Sondheim, conhecido por cinéfilos pelas canções de West Side Story, outro de seus espetáculas adaptado para as telonas.

Sob a regência de Burton, as músicas parecem pálidas, e principalmente, sem função narrativa. No mundo dos musicais, canção e dança devem expressar o que é insuficiente para as palavras.

O uso da música deve ser parcimonioso, construído como pequenos clímaxes, para que o artíficio não se balanize - afinal,é muito difícil que um filme tenha emoções "too marvelous for words" por duas horas seguidas.



Poucos cineastas ousaram romper esses padrões e partir para a ópera total, ou seja, o filme cantado do início ao fim. Jacques Demy, em Os Guarda-Chuvas de Amor, fez essa opção, mas tinha calibre para isso: seu longa é talvez proporciona uma hora e meia das mais emocionantes da história do cinema, um show de lirismo. Não cansa.

Seja com cuidado na colocação das músicas ou na perfeita tradução de sentimentos, o filme não pára. Se o filme tem que parar, a canção deve oferecer em troca ao espectador forte emoção ou dinâmica, contanto que o número se sustente. Basta ver os filmes de Bob Fosse: Sweet Charity e Cabaret param a historinha, mas a música e dança são eletrizantes, cheias de movimento e ironia.

No caso do filme de Burton, infelizmente, temos um típico caso de "tinta secando". Por melhores atores que sejam, Johnny Depp e Helena Bonham Carter cantam de maneira absolutamente banal.

O filme não é todo cantado, mas a música está até no "bom dia", sem que o filme tenha substrato emocional para tanto. As pessoas não precisam cantar, a música é desnecessária.

Mas, tudo bem, as canções não arrebatam, mas Burton teria alguma chance se fosse um diretor inventivo nesse gênero. Não é - os atores são filmados em primeiro plano, cantando (mediocremente), pronto. Não há dança.

O resultado é que o anárquico e cruel filme de Tim Burton acaba infelizmente soterrado por uma concepção cênica equivocada, que mina a força da ironia e da malvadeza da historinha.

O auge desse desencontro é o número musical que antecede o banho de sangue de Sweeney Todd. Johnny Depp canta sua raiva e sai gritando pelas ruas. Quando a canção acaba e estamos de volta à barbearia, Helena Bonham Carter olha para Depp com uma cara de "E daí?". Pois é, e daí?

>>> Por falar nisso, não percam.

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