domingo, dezembro 07, 2008

De coração

Romance, de Guel Arraes, vive travado pelo conflito autoral entre as preocupações do diretor e o estilo do co-roteirista, Jorge Furtado. Enquanto o filme mostra sincero interesse na relação entre artistas, entretenimento e formas de arte/mídia (cinema, teatro, tv), há um nervosismo de estrutura que faz com que esse interesse seja deixado em segundo plano em relação ao artifício.

O que vale é o truque, a metalinguagem, os jogos de espelhos entre a realidade e a atuação, independentemente do assunto que está na tela: o filme acaba sendo genérico em seu gosto pelo contorcionismo narrativo, e poderia se passar em qualquer outro universo, que não o dos atores. O truque, claro, é contribuição de Furtado, brilhante em curtas como Ilha das Flores e Barbosa, muito bom em O Homem Que Copiava e um pouco menos em Meu Tio Matou um Cara.

A obsessão de Furtado pela exploração das camadas narrativas do texto tomam conta do filme de modo que a direção competente de Arraes torna-se, na maioria dos casos, apenas ilustrativa. O filme já estava todo decidido na janela do Word.

Essas trucagens, aliás, são realizadas de maneira simpática e fluida, com correção. No entanto, só isso não é suficiente para espantar os fastasmas de filmes muito superiores, tanto sobre atores (Noite de Estréia, de Cassavetes - citar esse aí chega a ser apelação), quanto sobre texto e metalinguagem (Shakespeare Apaixonado, maravilhoso, muito mais que qualquer Charlie Kaufman). Enfim, o Arraes anterior, Lisbela e o Prisioneiro, era bem melhor e mais bem resolvido.

***

Estou em metade de O Coração É Um Caçador Solitário, de Carson McCullers, livro infinitamente delicado e melancólico da precoce escritora americana, que se saiu com uma obra dessas aos 22 anos. A tradução faz certo esforço para traduzir a fala dos negros com erros de português plantados de forma meio brusca, mas não tira o sabor nem o clima triste desse livro influente.

Capote, contemporâneo, bebeu forte aqui, e na capacidade que Carson tinha de criar poesia a partir do nada, com muito lirismo. A influência vai parar em outra amiga de Capote, Harper Lee, que emulou esse ambiente sulista filtrada pelo olhar infantil da mesma maneira no seu magnífico O Sol é Para Todos.

Um comentário:

Cilla Adriana disse...

Oii. Eu estava procurando sobre o filme "Bocage, o triunfo do amor" porque sou louca pra vê-lo pois uma atriz que eu sou muuuito fã participou desse filme e vi você comentando que odiou o filme, eu não encontro esse filme em lugar nenhum, e queria saber se você pode me dizer todos os detalhes possíveis do que vc lembra do filme de como ele é, a atriz que eu sou fã é a Viétia Zangrandi, ela fazia a Manteigui no filme. Grande beijo e desculpa a perturbação.
http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs.aspx?cmm=357512&tid=19132715&kw=bocage+o+triunfo+do+amor&na=3&nid=357512-19132715-110733622&nst=5