Sempre quis ver, mas nunca vi o Gabriela de Bruno Barreto, com Sônia Braga e Marcello Mastroianni. Fiquei com mais vontade de ver o filme depois que o sensacional Divórcio à Italiana, de Pietro Germi passou aqui em casa. A comédia de Germi, de 60 e poucos, traz Mastroianni como um siciliano chamado Don Fefe, obcecado em se livrar da esposa para ficar com a vizinha adolescente.
É muito engraçado ver esse mundo onde só há religião, família e muito sexo pelos olhos e pensamento de Don Fefe. O artifício é mais velho que andar para frente, mas toda vez que um personagem com opinião pouco lisonjeira das outras pessoas é o narrador de um filme, se o roteiro for bem escrito, é batata, sucesso imediato.
Nesse ponto, o roteiro de Germi é brilhante - ganhou Oscar. O humor farsesco é de primeira, cheio daquela gritaria italiana, e nunca perde o ritmo. As piadas são boas tanto no texto-navalha dos diálogos e offs, quanto na criação de situações cômicas. Poderia ser, portanto, alguma adaptação de Jorge Amado, escritor que acho o cúmulo da diversão, exímio contador de histórias e causos.
Aliás, já vi Mastroianni fazer de tudo com aquela cara de joão-sem-braço, como Fellini o chamava, mas aqui ele se supera. O cara é puro tipo: o senhor respeitável, cheio de tiques, bigodinho e olhar cansado. Por dentro, uma máquina de ironia, lascívia e divertida falta de caráter. Muito engraçado.
Depois de uma cerimônia de Oscar dos anos 70, Scorsese não perdeu a oportunidade convidar Mastroianni para visitar seu apartamento. O ator italiano chegou lá e encontrou muitos pôsteres de filmes de Rossellini, Antonioni, Fellini (a quem Scorsese credita a inspiração para Caminhos Perigosos, vinda do maravilhoso Os Boas Vidas), até que olhou para um quadro branco com duas retas pretas, que formavam o ângulo superior de um triângulo sem base - enfim, um acento circunflexo e mais nada. Mastroianni estranhou, mas era o cartaz polonês de Divórcio à Italiana. Depois eu escrevo mais sobre cartazes poloneses.
Prentendo fuçar mais na carreira de Mastroianni, já que devo ter visto no máximo uns 20 de seus 143 filmes (e não vi coisas muito importantes que ele fez com Mikhalkov, Polanski, Demy, etc), mas por enquanto, as melhores atuações dele:
10) A Noite, de Michelangelo Antonioni
9) A Comilança, de Marco Ferreri
8) Noites Brancas (Um Rosto na Noite), de Luchino Visconti
7) Dois Destinos, de Valerio Zurlini
6) Casanova e a Revolução, de Ettore Scola
5) A Doce Vida, de Federico Fellini
4) Oito e Meio, de Federico Fellini
3) Casanova 70', de Mario Monicelli
2) Um Dia Muito Especial, de Ettore Scola
1) Divórcio à Italiana, de Pietro Germi
2 comentários:
Gosto do cinismo de Mastroiani em La Dolce Vita, muito bem dirigido por Fellini.
"Gabriela", de Bruno Barreto, vi no extinto cinema Bahia da rua Carlos Gomes quando do seu lançamento em 1983. Fiquei decepcionado. Se, em "Dona Flor e seus dois maridos", o mesmo Barreto consegue desenvolver uma fluência narrativa que acaba por envolver o espectador, em "Gabriela" não existe um desenvolvimento narrativo convincente para que o filme pudesse se tornar agradável de se ver. Suas seqüências são estanques e o universo de Jorge Amado, que queria com o livro fazer uma crônica de um cidade de interior, é muito clicherizado (não gosto da expressão mas vou usá-la). Há um quê caricatural nos tipos apresentados que não se coaduna com a descrição dos personagens do romance. Apesar de Sonia Braga, que mereceu ser Dona Flor. Até mesmo Marcello Mastroianni, que considero um dos melhores atores do cinema de todos os tempos, está bem fraco, "apagado", sente-se que ele está "desconfortável" no tipo criado.
"Gabriela" passou recentemente no Telecine Cult.
Mas Mastroianni tem seu melhor desempenho em "Divorzio all'italiana", de Pietro Germi, uma comédia brilhante, feita com engenho e arte, saborosa, divertida, inteligente. Germi é um cineasta a descobrir nesta era de "baixamento internético". Vi dele vários filmes:"O ferroviário", da época neo-realista, "Seduzida e abandonada", "Aquele caso maldito", etc.
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