quarta-feira, outubro 15, 2008

Kaufman / Allen

Não vi A Natureza Quase Humana e Confissões de uma Mente Perigosa, mas conheço as obras mais famosas vindas do teclado de Charlie Kaufman: Quero Ser John Malkovich, Adaptação e Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças. Reconheço que ele tem idéias e habilidade, mas Kaufman não me interessa muito, porque tem sempre mais dedicação aos truques de roteiro do que às pessoas que habitam os filmes que seus textos vão gerar.

Mesmo que Quero Ser John Malkovich seja quase sempre brilhante, e os dois seguintes estejam num nívem bem bom, eu meio que suspeitava que Sinédoque, Nova York, estréia de Kaufman na direção fosse ser tão fora de controle como é.



Para o espectador, cabe decidir se é bacana ou não ser a vítima de uns bons dez anos de neuroses pessoais e artísticas atiradas na platéia com o mínimo de alinhavamento cinematográfico. É tudo um grande brainstorm, um rascunho não editado. A normalidade vai sendo abandonada pouco a pouco, o filme incha de surrealismo até as duas horas e meia de projeção, e não chega a lugar nenhum. Em estado bruto, as idéias de Kaufman conseguem ser ainda menos interessantes do que eu acho que elas normalmente são.

***

Desde o fraco Melinda & Melinda, que reunia de uma vez só a mesma história contada como tragédia e comédia, Woody Allen tem alternado os dois registros, filme sim, filme não: Match Point, Scoop, O Sonho de Cassandra e agora Vicky Cristina Barcelona, que é o mais solar de todos.



Não há nada de muito especial em relação à obra dele, mas, para quê, se é tudo tão prazeroso? Pessoalmente, Vicky... me lembra um grande filme leve, Conflitos de Amor, de Max Ophuls, adaptado da peça La Ronde, de Schnitzler. As pessoas flutuam numa ciranda interminável: uma se apaixona por outro, que ama um terceiro, e assim sucessivamente. O filme não acompanha os personagens, mas o amor: vai pulando de um em um, e cada ator fica só dez minutos em cena, por aí.

O novo Allen é diferente e menor, claro, mas é dotado da mesma leveza. As pessoas, mesmo que não se entreguem, estão extremamento vulneráveis aos próprios sentimentos, receptivas. Os encontros são bruscos, aparentemente forçados, mas sempre naturais. Parece um desses filmes como Feitiço da Lua, em que um fator imponderável deixa todo mundo mais sensível - é o tom perfeito para um filme de férias como esse, sobre americanos que vão aprender a viver do outro lado do oceano. Ah, mesmo "ok", Allen engole Kaufman em qualquer dia da semana.

Um comentário:

Anônimo disse...

Inveja. Onde você viu?