sábado, fevereiro 16, 2013

Lincoln

Por que as pessoas, quando partem para elogiar um filme de Spielberg, destacam a sua insuspeita sobriedade, a sua não-concessão ao melodrama? O melodrama é uma nobre arte, senhores, e alguns dos melhores momentos da carreira de Spielberg (A Cor Púrpura, Inteligência Artificial) passam justamente pela capacidade de levar esse gênero ao limite da emoção, de forma verdadeira e impactante.

O real problema spielberguiano é a infantilização de certos temas, e não a música alta. Ele ter segurado a mão em Lincoln não é exatamente um mérito. A qualidade do filme é bem outra, e bem spielberguiana, aliás: tirar entretenimento de pedra, como desse filme verboso, falado e provavelmente árido na mão de qualquer outra pessoa. É de embasbacar como o filme é leve, fluido, ágil. Se era realmente nojento e terrível transformar o holocausto num parque de diversões, como em A Lista de Schindler, aqui, em Lincoln, seu tratamento instigante e divertido não ofende. Não há nada de mau em flagrar um momento de real heroísmo na História com as devidas cores de emoção que esse heroísmo comporta.

Li por aí também um certo incômodo com a santificação de Lincoln no filme, e eu discordo disso completamente. Spielberg realmente não me parece filmar ele como lenda, como ícone; seu tratamento do personagem é bem terreno, mundano, pé no chão. O extrafilme da vida de Lincoln, o lado obscuro da sua vida, etc, não são uma questão. Spielberg registra um aspecto de Lincoln e dentro dessa história particular do Lincoln que ele mostra, o personagem parece muito bem balanceado, real, humano, e não um deus.

Daniel Day-Lewis é um ás nessa composição, enchendo o personagem por dentro de humor, classe, convicções, de um temperamento completo, e não apenas vestindo a carcaça, como Meryl Streep fez ano passado com sua Margaret Thatcher. O melhor ator em cena, no entanto, e pra variar, é Tommy Lee Jones.

PS: Esse filme dá uma boa sessão dupla com No, de Pablo Larraín, indicado ao Oscar de filme estrangeiro. Ambos os filmes falam de concessões para a conquista de objetivos bem maiores, ou seja, a base do relacionamento político.

Nenhum comentário: